sábado, 7 de janeiro de 2017
Liberdade Mário!
© Mário Soares em campanha eleitoral, 1986. D.R. Visão |
Quando estudava na universidade, dei muitas vezes por mim a pensar onde raio e a que fontes tinham ido alguns historiadores beber. Algumas vezes achei que era tudo inventado e um delírio. Aprendi que a história contemporânea - esse período que nunca mais acaba - ainda vai ser escrita.
Não vou fazer história com o que escrevo aqui, mas quem sabe ajudarei os futuros historiadores a perceber parte, uma ínfima parte do momento de hoje, hoje, início de Janeiro de 2017, hoje, morte de Mário Soares. Porque estamos a viver um momento importante da história. Mário Soares morreu.
Perceber o que aqueles que viveram antes de nós deixaram escrito é quase sempre duvidar do que está por detrás das palavras. Historiadores do futuro, vou tentar ser clara.
Hoje, o que me apoquenta [e que reflecte uma das posturas da sociedade perante a morte de Soares] é que algumas pessoas não se inibiram de tecer comentários desrespeitosos acerca daquele que lhes permite hoje ter voz - voz, diga-se, felizmente e apenas, nas redes sociais. O que é isso? É um "sítio" a que chamam de "a nuvem" onde algumas pessoas expõem por escrito ou através de imagens ou vídeos os mais diversos assuntos, onde outras pessoas lêem o que as outras escrevem [publicam], onde todas as pessoas podem [através de alguns predicados] falar "instantaneamente" entre si [estando "online", ligadas a uma rede que lhes permite comunicar em tempo "real"], através de mensagens privadas. Bem, a este assunto voltarei, a seu tempo.
O que quero deixar escrito por aí é que estou triste, não apenas porque a morte é um momento de síntese [que nos relembra que não viveremos para sempre], mas porque deixou de existir um homem a quem devemos tanto - e me entristece que alguns não consigam ver para lá do pormenor e não reconhecer a sua enorme importância.
Uma das minhas poucas recordações do passado é do dia em que Mário Soares venceu as eleições, em 1986, teria eu dez anos de vida. A minha mãe a conduzir uma Diane [um carro igual ao da fotografia], a casa da Ermelinda (ou da Ângela?) nas Enguardas, a televisão, a expectativa do resultado final - e a alegria nas ruas que se viveu com a sua vitória. "Soares é fixe". E que fixe que foi toda aquela euforia! Muito provavelmente porque a minha mãe e os seus amigos ficaram contentes - e a minha avó Ana que era também admiradora de Soares - também eu adorei essa noite alegre e feliz. Alguém importante - de quem tantas pessoas gostavam e em quem tantas pessoas votaram - iria ser o Presidente de Portugal. Alguém fixe, que deixou toda a cidade de Braga em sorrisos abertos. Quando na escola aprendi sobre o 25 de Abril, já sabia as músicas do Zeca de cor, veio-me sempre à memória este episódio feliz.
Não podia deixar de prestar homenagem à memória de Mário Soares. É o mínimo que posso fazer neste momento que fecha o ciclo da sua vida.
Não sei o que terá sido viver o 25 de Abril, muito menos o antes. Nasci depois, quase a celebrar o dia, a 20 em Abril de 1975. Tenho quase a mesma idade da revolução e o Mário já cá andava há muito, a lutar, com grande coragem, por nós. Não sei o que seria a minha vida se o Mário não tivesse existido. Talvez nem tivesse sido concebida, nesse ido verão de 1974.
Obrigada Mário, gosto de ti!
[e para os historiadores do futuro, por onde começou este texto que nada disse, há felizmente o MEC, que disse quase tudo:
Mário Soares não levou nada com ele. Deixou tudo connosco. É essa a maior generosidade que uma pessoa pode ter: querer tudo para os outros e dedicar a vida a lutar por isso — e por nós.]
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